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terça-feira, 23 de agosto de 2011

Um Teste de Fé

Numa noite solitária, nas Rochosas do Colorado, ouvi esta mensagem: "Brennan, você dá completa atenção a determinados membros da comunidade e está sempre com eles, mas oferece apenas uma presença negligente a outros. Os que têm estatura, riqueza e carisma, os que você considera interessantes ou encantadores, belos ou famosos recebem total atenção. Entretanto, as pessoas que você considera comuns ou desmazeladas, os de nível social mais baixo, que executam tarefas servis, os que não são cantados em prosa nem celebrados, estes não são tratados com a mesma consideração. Isso não é irrelevante para mim, Brennan. Sua forma de ser com os outros, no dia-a-dia, independentemente de sua posição, é o verdadeiro teste da fé".

Mais tarde naquela noite, enquanto pescava de sono, imagens contrastantes dançavam na tela da mente: Carlton Hayes, um atleta magnificamente talhado aos vinte e poucos anos, 1,90 de altura e 84 quilos, pula numa cama elástica com o brilho irresistível de um sorriso. Uma multidão se ajunta. Ele passa a pular corda — uma mostra deslumbrante de coordenação, agilidade e graça. Os espectadores dão vivas. "Louvado seja o Senhor", grita o atleta.

Enquanto isso, Moe, um de seus ajudantes, se aproxima com uma garrafa de água. Moe tem pouco mais de cinqüenta anos, tem 1,62 de altura e é barrigudo. Usa um terno amarrotado, camisa com o colarinho aberto, gravata fora do lugar. Moe tem uma pequena faixa de cabelo emaranhado e ensebado, que vai das têmporas até a parte de trás da cabeça, onde desaparece num grumo de cabelo meio preto, meio cinza. O pequeno ajudante está com a barba por fazer. Suas bochechas gordas e caídas, e um olho de vidro fazem os olhos dos expectadores se desviarem rapidamente.

É um bronco patético — diz um homem. Apenas um parasita obsequioso, sugando um artista — acrescenta outro.

Moe não é uma coisa nem outra. Seu coração está enterrado em Cristo, no amor do Pai. Ele se move sem constrangimentos no meio da multidão e entrega graciosamente a água para o herói. Ele se sente ajustado, como uma luva na mão, ao seu papel de servo (foi assim que Jesus se manifestou pela primeira vez a Moe e transformou sua vida). Moe se sente seguro consigo.
Naquela noite, Carlton Hayes faria o discurso principal no banquete da Associação dos Atletas Cristãos, vindos de toda parte dos Estados Unidos. Além disso, seria homenageado com uma taça de cristal, por ser o primeiro atleta a ganhar oito medalhas olímpicas.
Cinco mil pessoas se reuniram no hotel Ritz-Carlton. Celebridades do mundo da política, dos esportes e da mídia estão espalhadas por todo o salão. Quando Hayes se dirige ao pódio, a multidão está quase no fim de uma refeição suntuosa. O discurso do orador é abundante em referências ao poder de Cristo e à imperturbável gratidão a Deus. Corações são tocados, homens e mulheres choram livremente e, então, ovacionam em pé.

Mas, por trás desse cintilante discurso, o olhar vago de Carlton revela que suas palavras não habitam sua alma. O estrelato corroeu sua presença junto a Jesus. A intimidade com Deus se esvaneceu na distância. O sussurrar do Espírito foi abafado pelo aplauso ensurdecedor. Sustentado pelo sucesso e pelo rugido da multidão, o herói olímpico movese facilmente de uma mesa a outra. Ele se engraça com todos, desde os garçons até as estrelas de cinema.

Ao mesmo tempo, num hotel barato, Moe come sozinho sua quentinha congelada. Não foi convidado para o banquete no Ritz-Carlton porque, ele simplesmente não se encaixaria ali. É claro que não seria adequado para um ajudante bronco, com barriga de bujão e um olho de vidro puxar uma cadeira ao lado de pessoas como Ronald Reagan, Charlton Heston e Arnold Schwarzenegger.

Moe senta-se à mesa de seu quarto e fecha os olhos. O amor do Cristo crucificado o invade. Seus olhos se enchem de lágrimas. "Obrigado Jesus", sussurra, enquanto retira a cobertura plástica da lasanha esquentada no microondas. Ele folheia sua Bíblia até o salmo 23.

Eu também estava no sonho. Onde escolhi passar a noite? O impostor alugou um smoking e fomos ao Ritz. Na manhã seguinte acordei às quatro horas da madrugada, tomei um banho, fiz a barba, preparei uma xícara de café e passei o polegar na borda da Bíblia. Meus olhos caíram numa passagem de 2Coríntios: "De modo que, de agora em diante, a ninguém mais consideramos do ponto de vista humano" (5:16; NVI). Ai! Carrego o peso morto do falso eu até mesmo em meus sonhos.

Brennan Manning - O Importor que Vive em Mim.

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